Tino, meu amor, é imperioso voltar
Voltar à terra dos vivos onde tu não estás
Voltar ao hospital onde ainda estás
Voltar a ver a tua casa que não é mais minha porque tudo o que era meu foi contigo
Voltar ao cemitério de Tourais, à campa nº 80, ao terreno que adquiri para que seja eternamente teu
Como eu sou eternamente tua
Levo na travessia, por sobre os mares, terras, desertos, florestas e montanhas, as tuas fotos, os teus escritos
Vão e voltam comigo, é tudo o que tenho
Peregrina, levo a terra africana colada aos meus pés e o coração cheio de gente que fica à minha espera
No adeus que me fazem falta o nosso querido amigo, que fica tão doente...
Não o posso carregar como não te pude carregar a ti para a terra dos vivos porque a vida e a morte não nos pertencem
Eu estava bem na terra dos mortos, mais próxima de ti e de Deus, porque esses mortos ressuscitarão como tu e é imperioso que ressuscitem para a vida
Levo no meu coração, que tem a forma do continente africano, todos os que amo, de longe ou de perto, do meu país, da minha família, os meus amigos de cá e de lá
Levo os meus alunos que me pedem «mãe, volta»
Não precisariam, porque o meu corpo suspenso no ar aterrará e sairá numa outra terra ou em terras que irão dar sempre ao mesmo lugar porque a terra é redonda
Deixo, deixo o sol da África que aqueceu o meu corpo frio desde a tua partida
O sol que queimava a minha ferida cada vez que ela sangrava
É apenas um intervalo, para voltar à terra dos vivos onde não estás...
Se chegar, voltarei pelo mesmo caminho ao fim do mundo onde Deus fala mais alto ou onde eu o ouço melhor nos silêncios quentes e pesados das noites africanas
Ninguém sabe mas o mundo é igual em toda a parte
A diferença é tu estares ou não
Deixaste-me tanta coisa para fazer que mal tenho tempo de escrever tudo
Dizes, nos teus escritos, que o teu sonho era escrever um livro
Não sabes que deixaste um escrito
Eu sou apenas as tuas mãos e os teus pés, os teus olhos, o teu coração, a tua carne
O meu corpo o teu corpo
Porque o teu corpo se fundiu com o meu
Dois seres, um só corpo
Um corpo solitário na travessia do ar
Mas, serás tu um desses anjos que me conduzem pela mão?
Há pessoas que nunca morrem...
ResponderEliminarAinda que deixem de fazer parte deste mundo(dos vivos), permanecerão imortais na nossa memória, no lugar vazio ocupado pela saudade.
Pelo que li aqui, sinto que o Tino foi alguém muito especial e a sua partida deixou um vazio enorme no coração de quem o amava.
Como pode ver aqui: http://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=107142 , assim que soube da sua partida, não pude deixar de lhe fazer uma singela homenagem, pois mesmo sem contacto, há amizades que são para todo o sempre!
E também neste comentário que deixei num blog de alguém da sua terra natal(Dreia), sítio pelo qual fiquei a saber da sua partida(parece que o destino me chamou lá naquele dia).
Há pressentimentos que não se explicam...
Conheci o Tino há muitos anos, mais precisamente no início da década de oitenta, numa tarde quente de Junho, na vila de Arganil.
Tinha ido ver as minhas notas à escola e, por acaso, dois jovens de mochila às costas abeiraram-se de mim para me pedir uma informação, um desses jovens era o Tino. A partir daí estreitaram-se laços de amizade que os levaram à minha aldeia e até a minha casa, onde foram muito bem recebidos por todos nós e onde permaneceram por mais de uma semana.
Guardo muito boas recordações dessa amizade tão longínqua, mas da qual ainda tenho algumas preciosas recordações sob a forma de palavras escritas e até algumas fotos.
Nunca pensei que hoje, ao passar por mero acaso por este site, me deparasse com esta notícia que me entristece bastante...
Deixo aqui um dos poemas que o Tino escreveu aquando dessa estadia na minha casa e me ofereceu um dia:
Divagando
Divagando
Por um mundo sensório
De pensamentos
Benesse
Apática
De carisma
Supra producente;
Chalaceando
Com a ignominia
Insalobre;
Chiclette
Mascado
Com avidez!
Leva na boca,
Rilhando os dentes.
Apatia a si próprio!
Ri-se dos outros
Riem-se dele
Num riso constante.
Quando chora
Riem-se dele.
Quando morre
Fica só!
Morre o seu eu
Morre ele
Morrem outros
Ficam outros
Com vontade
De viver
(Pai das Donas 25-VII-83
Florentino)
Este blog é de uma ternura e de um sentimento sem igual e se esta é a forma que encontrou de superar a dor da sua ausência, só me resta dizer-lhe que a admiro mesmo sem a conhecer.
PS. Coincidência ou não, uns dias antes tinha encontrado um outro blog onde deixei algumas palavras (comentário que ficou para aprovação) sem no entanto ter obtido qualquer resposta... percebi depois porquê.
O blog era este:
http://allahuakbar-lavrador.blogspot.com/